Você não gosta do seu próprio corpo? Descubra como o autoconhecimento pode te ajudar

0
1633

Sabrina de Oliveira, 23, não gostava de se olhar no espelho. De repente, por causa de um comentário indesejado ou por conta de uma peça de roupa que não lhe servia, a estudante dava tapas e desferia arranhões contra o próprio corpo.

No ano passado, a professora Tatiana dos Reis, 32, não queria mais viver. Ela perdeu o interesse pela vida e tentou o suicídio após o término de um relacionamento de dez anos. A decisão partiu do noivo, três meses antes da data marcada para oficializar a união.

O rapaz disse que não a queria mais, pois ela estava gorda, caída e malcuidada. Desde então, a professora não consegue mais se olhar no espelho sem chorar, tampouco se alimenta regularmente. “Violência contra a mulher não é só física, não é só soco e pontapé, também é emocional”, queixa-se Tatiana.

Estranhos no ninho

E muitas vezes a agressão parte de quem deveria nos proteger. Os comentários da mãe de Gabryelly Braga, 16, afetam em cheio a autoestima da filha, que sofre desde a infância para aceitar a própria imagem.

A aflição com o assunto é transitória e se altera ao sabor dos ventos. Às vezes o estado de espírito de Gabryelly aponta para um bom caminho. Mas, então, quando menos espera, a adolescente escuta da mãe que o nariz é feio e que ela está acima do peso. “Eu faria uma rinoplastia, e talvez mandaria tirar uma costela”, confessa a menina.

Joabe Ferreira, 16, era motivo de chacota na infância. O excesso de peso estimulava comentários maliciosos entre pessoas da própria família. “Dentre os meus irmãos eu era o mais feio”,relembra o que costumava ouvir dos parentes. Ele levou a sério. Aos 14 anos, cansou de tentar reconhecer algo bonito em si mesmo. E então, começou a se cortar.

Assim como Sabrina, Tatiana, Gabryelly e Joabe, milhares de pessoas estão insatisfeitas com o que são ou como estão fisicamente. E o número aumenta a cada dia, principalmente entre os mais jovens. Em 2007, um estudo da Secretaria de Saúde de São Paulo (SESP) constatou que 67% dos adolescentes estavam infelizes com o próprio corpo.

Poucos anos depois, em 2012, outra pesquisa realizada pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) trouxe à luz um número ainda mais preocupante: 80% dos jovens não estavam felizes com o que viam no espelho.

Por dentro do problema

O que leva uma pessoa a rejeitar o próprio corpo? A questão é complexa, avisa a psicóloga Layane Gomes.

São muitos os fatores. Uma criança que a todo momento escuta comentários negativos sobre a própria aparência, por exemplo, tende a acreditar no que ouve. A situação é o primeiro passo para que ela desenvolva baixa autoestima e leve o problema para a idade adulta, explica a profissional. Foi o que aconteceu com Joabe, de quem falamos agora há pouco.

A psicóloga Karla Cardozo afirma que episódios traumáticos, insegurança, relações abusivas, ambientes de convívio tóxicos, mídias sociais e muitos outros motivos também colaboram para a situação. “Os padrões impostos através das mídias sociais criam uma distância entre a realidade e as expectativas impondo um padrão de beleza que não é realista”, avalia.

Quando isso acontece, a saúde física e mental do indivíduo está em risco. A pessoa é capaz de praticar enormes sacrifícios, como adotar dietas exacerbadas e consumir produtos duvidosos. Acima de tudo e, às vezes, da própria saúde, ela almeja conquistar o irreal padrão de beleza que tem em mente. Em consequência, o desagrado psicológico com o próprio corpo pode se transformar em adoecimento físico e levar a sérios transtornos.

“Os mais comuns são os alimentares, referentes à preocupação excessiva com peso/aparência, por exemplo: bulimia, anorexia, vigorexia, compulsão alimentar e obesidade”, esclarece a psicóloga Karla Cardozo.

Identifique quem precisa de ajuda

Tudo tem relação com a autoestima. Karla Cardozo cita uma pesquisa desenvolvida pela Dove chamada Verdades sobre a Beleza. O estudo constatou que apenas 4 em cada 100 mulheres no mundo se acham bonitas.

Portanto, se sentir para baixo em determinados momentos da vida é inteiramente normal. A situação se torna preocupante quando a pessoa permanece nesse estado por um período prolongado, alerta a profissional.

Autocritica exagerada, medo de rejeição, dificuldades em aceitar elogios, comparação em excesso com outras pessoas, sentimento crônico de insatisfação, repulsa de si mesmo, sentimento de inferioridade, necessidade constante de elogios e valorização, dentre muitos outros sinais, pode indicar que alguém precisa de ajuda, orienta a profissional.

Para Layane Gomes, um dos principais indicativos de que a insatisfação com si mesmo não é temporária e, portanto, saudável, pode ser descoberto por meio da análise das relações sociais do indivíduo. Quando ele se vê prejudicado em diversas situações do cotidiano por conta da insegurança, alguma coisa saiu do controle.

Estenda a mão

O próximo passo é procurar um profissional especializado para ajudar a pessoa em sofrimento. Às vezes, uma mão amiga é tudo o que alguém precisa.

Foi a de uma amiga que salvou a vida da professora Tatiane dos Reis. E do namorado que ajudou a dar mais qualidade de vida à estudante Sabrina de Oliveira. Elas não estão curadas. Crises são comuns. Mas se comprometeram com o tratamento.

Gabryelly Braga nunca falou com ninguém sobre o problema que enfrenta em relação ao próprio corpo.

A irmã de Joabe Ferreira não gostou de saber que o garoto foi diagnosticado com depressão. Não por se preocupar com o sofrimento, comum às pessoas nesse quadro, que o irmão estava enfrentando. Mas por duvidar do veredito do profissional ao qual ele se submeteu.

Ela o proibiu de seguir com o tratamento. “Ela me disse que eu era muito novo pra ter essas coisas”, comenta. A deterioração do sofrimento de Joabe, entretanto, chamou atenção do pai dele. O apoio, também da mãe, foi fundamental para que o menino começasse a se reerguer.

Hoje, está bem com o corpo, ajeitou a postura. Sente-se feliz com os traços que estampa no rosto, e que outras pessoas não têm. Joabe sabe que é uma pessoa única. Além do apoio dos pais, ele atribui a melhora às amizades certas.

O tratamento psicoterápico

A psicoterapia é o tratamento mais adequado, indica Layane Gomes. O processo varia de acordo com cada indivíduo. Não há fórmula mágica. É importante saber que a forma com que lidamos com nossos problemas é única.

Além do mais, o processo que leva à retomada da boa autoestima não é simples e envolve diversos fatores, explica Karla Cardozo. É imprescindível a busca por um profissional especializado para trabalhar a autoaceitação. O tempo do tratamento varia, pois envolve diversos fatores, como o comprometimento do paciente com a mudança.

A profissional ressalta que a autoestima não é imutável. Ela está em constante modificação, de acordo com as nossas experiências de vida.

O poder do autoconhecimento

Cuide do seu corpo, do seu cabelo, saia com pessoas que te façam se sentir bem e busque atividades que te dão prazer. Não busque atingir um padrão de beleza inatingível. Respeite os seus limites e cuide de você, orienta Karla Cardozo.

“Um exercício que eu gosto muito de fazer é: todo dia pela manhã após se arrumar se olhe no espero e diga uma coisa positiva sobre o seu corpo e sobre a sua personalidade. Tente fazer esse exercício por no mínimo 30 dias, tentando sempre pensar em diferentes qualidades sobre você, escreva essas características todos os dias em uma espécie de diário e nos dias que não estiver se sentindo tão bem, leia. Pode parecer um exercício simples, ou até mesmo bobo mais isso pode te ajudar a buscar aspectos positivos sobre você estimulando uma visão positiva sobre você”, aconselha a psicóloga Karla Cardozo.

Layane Gomes insiste em lembrar: o modelo ideal de beleza não existe. Portanto, liberte-se da vontade de alcançá-lo. Se valorize. Se cuide. Se ame.  Cada beleza é única, então, ame sua individualidade, trabalhe seu autoconhecimento.

“Se tiver a oportunidade faça através da psicoterapia. Repitam sempre o quão maravilhosas vocês são, fujam de pensamentos autodepreciativos e façam apenas aquilo que as faça se sentir bem”, completa.

Decida ser feliz

Não desista de você. Lute por sua autoestima. Joabe Ferreira, que já escutou que o tratamento contra a baixa autoestima não iria fazer efeito, mas não se deixou abater, tem autoridade para falar sobre o assunto: se você tem um problema, procure ajuda.

“Se você tem um problema, procure ajuda! Não ache que precisa passar por isso sozinho, por que não precisa. Você pode procurar ajuda porque somos amantes da vida. O que mais amamos fazer é viver! Quando compramos um carro ou uma casa é sempre para alcançar condições melhores de vida. Dores musculares e dores de cabeça que você sente são o seu corpo implorando pra você mudar seus hábitos para viver melhor. Então sim, a vida é bela de se viver independente das condições. E se está ruim podemos melhorar”, incentiva Joabe Ferreira.